A ESCALADA NAS TENSÕES POLÍTICAS ENTRE ESTADOS UNIDOS E IRÃ
Parte IV: Os efeitos da administração Donald Trump
Por Éder Israel
Disponível
em: <https://www.kurdistantv.net/sites/default/files/2018-06/yyran_lydwanhkany_poempyoe_shbarht_bh_rybhr_w_hkwmhty_yymh_bybnhma_w_droeynn.jpeg>
acesso em 12 jan. 2020
Durante a administração
Barack Obama (2009 - 2017) a política externa dos Estados Unidos foi claramente
centrada na diplomacia e no debate de temas de interesse comum, evitando em
muitas oportunidades instabilidades internacionais. Porém, com a chegada de
Donald Trump ao poder em 2017, a política externa do país se parece a cada dia
mais com aquela empregada por George W. Bush a partir de 2001.
Após
a ratificação do Acordo Nuclear do Irã em 2015, a situação geopolítica entre o
país asiático e os Estados Unidos passou por um curto período de relativa
tranquilidade, embora houvesse de ambos os lados a desconfiança se a contraparte
iria ou não de fato respeitar seus compromissos, mas mesmo sem a materialização
esperada, o contexto pós acordo foi bem menos turbulento que as rusgas e
arengas entre Mahmoud Ahmadinejad e George W. Bush. Porém, a eleição
presidencial de 2016 na potência americana iria ruir qualquer base, ainda que
frágil, da politica externa e diplomacia estadunidense. Donald Trump trouxe na
bagagem a combinação explosiva de inexperiência política com apreço midiático.
A
administração Trump retoma o diálogo intervencionista em relação aos países do
Oriente Médio, tendo como justificativa teórica a garantia da segurança e o
reconhecimento do Estado de Israel, além da reedição da chamada Guerra ao
Terror, visando teoricamente combater a ação de organizações terroristas que
atuam na região. Mas sabe-se [como sempre se soube] que a quase totalidade das
ações das potências ocidentais no Golfo Pérsico tem como interesse principal o
controle a produção de petróleo para o mercado global. Portanto podemos afirmar
que durante o governo George W. Bush a postura estadunidense se baseou no
intervencionismo externo e nas ações militares, posteriormente o governo Barack
Obama adotou uma política pautada no diálogo e na diplomacia, reaproximando os
Estados Unidos do restante do mundo e na atualidade, o governo Donald Trump
retoma a postura da Doutrina Bush e dá sinais claros que a política externa
estadunidense retornará ao intervencionismo, e a instabilidade voltará [leia-se
ampliará] ao Oriente Médio.
A
postura adotada por Donald Trump em suas ações governamentais criou um conceito
novo, popularizado pela Ciência Geográfica moderna, chamado “desglobalização”.
Na verdade a tal “desglobalização” é aquilo que até alguns anos atrás era
chamado de isolacionismo político, quando uma nação começa a romper acordos e
compromissos internacionais e a adotar posturas políticas unilaterais, tal como
fez George W. Bush ao invadir o Iraque sem o consentimento do Conselho de
Segurança da ONU. É basicamente a mesma coisa que a administração Trump tem
feito ao ameaçar intervir militarmente no Irã ou na Palestina, ou mesmo a
decisão de transferir a embaixada estadunidense em Israel da cidade de Tel Aviv
para Jerusalém, considerando formalmente a cidade em questão como capital do
Estado judeu. Todas essas são posturas unilaterais, que no passado chamávamos
de isolacionismo e no presente “gourmetizaram”
sob o nome de “desglobalização”.
Disponível
em: <
https://media3.s-nbcnews.com/j/newscms/2018_31/2426121/180509-trump-iran-mc-742_1208f3ad933226f426421bd0f996a2a8.fit-760w.JPG
> acesso em 12 jan. 2020
A atitude isolacionista
[se preferir, desglobalizante] de Donald Trump se manifesta na assinatura de
decretos que vão contra a ordem natural da integração global, como a saída do
Acordo Nuclear do Irã (criado pelo P5+1), a saída do Acordo Climático de Paris
(que ampliava as propostas do Protocolo de Kyoto), a saída do Conselho dos
Direitos Humanos da ONU.
Quando
os Estados Unidos formalizam em 2018 sua saída do acordo nuclear negociado a
partir de 2013 com o Irã, o governo americano está oficialmente se desobrigando
a cumprir os termos e responsabilidades assumidos quando da sua assinatura, que
se referem à retirada das sanções econômicas nas relações comerciais com o país
comandado pelo aiatolá Khamenei. Porém, a adoção de uma postura unilateral por
uma das partes implica na adoção da mesma postura pela parte oposta, logo, o
governo iraniano se vê também desobrigado a cumprir seus compromissos no
acordo, que se referiam à redução do enriquecimento de urânio e à liberação da
visita de inspetores internacionais. Ou seja, as sombras da incerteza novamente
pairam sobre as intenções do programa nuclear da República Islâmica.
O
modo de governar do presidente Trump deu origem novamente à troca de ofensas de
ambos os lados [acalmada desde a saída da dupla Ahmadinejad e Bush do poder], lançando
bases que trazem mais uma vez o contexto das intervenções ocidentais no Oriente
Médio. Porém, como mencionado, a política externa unilateral adotada pela Casa
Branca não favorece à criação de uma coalizão que una esforços em uma campanha
militar, ou seja, se os estadunidenses quisessem de fato atacar o Irã teriam
que fazer isso sozinhos [ou quase], com duas dúvidas latentes: a primeira, se o
país asiático possui ou não armas atômicas [definitivamente não compensa pagar
para ver...] e a segunda, se uma intervenção ocidental não poderia aproximar
persas iranianos dos árabes do Oriente Médio, em uma força de resistência ou
pior, em uma força de ataque contra Israel, aliado dos Estados Unidos. São
muitas variáveis envolvidas para alguém arriscar dar o primeiro passo.
Na
falta de comprovação acerca das motivações militares do programa nuclear
iraniano, a potência americana precisa de outra justificativa na qual possa se
basear para (re)impor as sanções econômicas e comerciais à República Islâmica e
quem sabe para sustentar as motivações para uma intervenção militar, sem o aval
do Conselho de Segurança da ONU. Trump recorre ao que já está pronto, à boa e
velha Doutrina Bush... Lembre-se que o Irã foi colocado no chamado “Eixo do
Mal”, grupo de nações que são acusadas de apoiar organizações terroristas; pois
bem, o governo estadunidense passa a classificar a Guarda Revolucionária Iraniana
[grupo de elite do exército do país] como organização que promove e apoia atos
terroristas, e portanto teria que ser combatida pelos Estados Unidos, para que
a paz e a segurança voltassem a reinar no mundo [é...].
Disponível
em: <https://a57.foxnews.com/media2.foxnews.com/BrightCove/694940094001/2019/06/21/931/524/694940094001_6050822982001_6050822507001-vs.jpg?ve=1&tl=1>
acesso em 12 jan. 2020
A importância
estratégica do Estreito de Ormuz para o mundo dá ao Irã uma carta na manga valiosa
para os embates geopolíticos do mundo moderno, posto que essa importante rota
petrolífera tornaria muito fácil a realização de um bloqueio, que afetaria
imediatamente o preço global do petróleo e toda a economia baseada nesse
recurso.
Já
em 2019 os Estados Unidos afirmaram que a Guarda Revolucionária Iraniana seria
responsável pelos ataques a dois navios petroleiros que cruzavam o Golfo de
Omã, próximo ao Estreito de Ormuz (importante rota comercial para o petróleo
exportado pelo Golfo Pérsico). Como se trata de um ponto estratégico para a
economia moderna, posto que por ali passe cerca de 30% de todo o petróleo
consumido no mundo, o Irã, país com a maior zona costeira no estreito, ameaça
frequentemente bloquear essa rota marítima, o que ocasionaria prejuízos desmedidos
ao capitalismo. Sistematicamente as embarcações da força militar de elite
iraniana são avistadas realizando manobras na região, o que aumenta ainda mais
a constante tensão nessa área.
O
grau da tensão se tornou ainda mais alto na semana seguinte aos supostos
ataques aos petroleiros do Japão e da Noruega, quando um drone de vigilância dos Estados Unidos, avaliado em cerca de 120
milhões de dólares, foi abatido pela Guarda Revolucionária Iraniana, enquanto
sobrevoava a região do Golfo Pérsico. Segundo a força militar do Irã, a
aeronave invadiu o espaço aéreo iraniano, segundo os Estados Unidos a aeronave
sobrevoava áreas externas aos domínios do Irã. Semanas depois, as forças
militares iranianas barraram um petroleiro da Inglaterra, aliada histórica dos
Estados Unidos em assuntos externos, sob o pretexto de a embarcação ter se
envolvido em um acidente com um barco de pesca local. Após esse evento, uma
instalação de refino de petróleo da Arábia Saudita foi atacada, supostamente
por drones iranianos (porém o Irã alegou que os ataques partiram de rebeldes do
Iêmen, que lutam contra o governo daquele país, apoiado pelos sauditas...), o
que afetou severamente os preços internacionais do petróleo, e levaram os
Estados Unidos a subirem o tom das ameaças [a Arábia Saudita, assim como
Israel, representa uma base importante de apoio para os estadunidenses no Oriente
Médio].
Disponível em:
<https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/1/19/US_Navy_061031-N-3901L-023_Sailors_from_Mobile_Inshore_Undersea_Warfare_Unit_One_Zero_Five_%28MUIWU-105%29%2C_board_a_plane_to_deploy_to_the_5th_Fleet_area_of_responsibility_%28AOR%29_in_support_of_the_global_war_on_terrorism.jpg/800px-thumbnail.jpg
> acesso em 12 jan. 2020
O envio de novas tropas
para a Arábia Saudita, importante aliado no Oriente Médio, faz parte da guerra
midiática travada atualmente entre os Estados Unidos e o Irã. Desde a Guerra
Fria, governos entenderam que muitas vezes a propaganda que se faz do tamanho
de seu poder bélico é capaz de provocar efeitos mais devastadores do que sua
utilização efetiva nos campos de combate.
Seja
como for, é mais um capítulo na enxurrada de acusações entre os governos dos
dois países, e o governo do Irã anunciou no final de 2019 que não se vê mais
obrigado a cumprir os termos do acordo nuclear firmado em 2015, e que
reativaria as unidades de enriquecimento de urânio e retomaria o programa
nuclear nacional, supostamente para fins pacíficos, e alegadamente pelos
estadunidenses como sendo para fins militares. Em resposta, o governo americano
anunciou o envio de milhares de soldados para as bases que mantém na Arábia
Saudita, ampliando os rumores de um conflito eclodir na região.
Continua...
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