segunda-feira, 16 de novembro de 2015

O DESASTRE SÓCIO-AMBIENTAL DE MARIANA - MG (parte 2)

O amargo futuro do rio Doce

Por Éder Israel



Disponível em: < http://msalx.veja.abril.com.br/2015/11/09/1858/pe6Cx/alx_brasil-barragem-mariana-20151109-013_original.jpeg?1447102717 > Acesso em 13 nov. 2015

Após o rompimento das barragens e da liberação dos resíduos contaminados serra a abaixo, a gravidade se encarregou de fazer seu trabalho, arrastando tudo que havia pelo caminho em direção ao vale do rio Doce, levando para a água que abastece cidades mineiras e capixabas todo tipo de rejeito proveniente das atividades mineradoras.

Confesso que inicialmente pareceu-me apenas uma água turva e barrenta, que transbordaria as águas do rio Doce, porém após sua passagem as águas do rio voltariam a se "limpar", como ocorrem após as fortes chuvas que sujam as águas deste rio no verão mineiro. Porém, duas notícias (que não posso precisar as fontes e nem averiguar completamente suas veracidades) trouxeram um golpe seco de realidade à visão minimalista que esse desastre trouxe a muitos de nós.

A primeira notícia é na realidade um relato de um químico de que as primeiras análises da água do rio Doce após a chegada da lama da SAMARCO davam a impressão de que alguém havia jogado a tabela periódica inteira dentro do rio, tamanha a quantidade e a diversidade de elementos químicos (muitos deles contaminantes) presentes e observáveis nas amostras. Segundo dados laboratoriais foi observada na água a presença de manganês, arsênio, mercúrio, alumínio, ferro, chumbo, boro, bário, cobre, dentre outros materiais contaminantes.

A segunda notícia, ainda mais alarmante partiu da SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Governador Valadares - MG), que atestou que nas amostras avaliadas pelos seus laboratórios, havia na água contaminada pela lama da SAMARCO uma quantidade de metais muito superior ao aceitável pela Organização Mundial de Saúde - OMS e por outros órgãos internacionais. Segundo esta avaliação, havia uma quantidade de ferro 1.366.666% acima do normal; já o manganês, material tóxico, estava 118.000% acima do normal; o alumínio encontrava-se 645.000% além dos valores toleráveis, além dos demais materiais ali presentes.

A tabela a seguir, divulgada pela prefeitura de Governador Valadares, se refere aos valores observados para alguns destes materiais presentes na água no dia 11 de novembro, seis dias após o vazamento.



Fonte: < http://img.r7.com/images/2015/11/11...> Acesso em 15 nov. 2015

A torrente de lama que chegou à calha do rio Doce pode ser responsável pelo maior desastre ambiental da história do Brasil, sob o risco de dizimar toda a fauna e flora aquática e ribeirinha do rio. A mortandade de peixes observada assusta, embora as autoridades que deveriam se atentar ao problema se mostram incapazes de esboçar qualquer tipo de reação efetiva, o que na verdade é típico do Brasil, onde as questões urgentes são sempre suprimidas por algum acontecimento de grande magnitude e mais recente que se observa.



Disponível em:< http://s2.glbimg.com/vC4KqkJkElWMdSCRjQ_WmAA3lwg=/e.glbimg.com/og/ed/f/original/2015/11/13/rio_doce.jpg> Acesso em 15 nov. 2015

Um dos grandes questionamentos que deveria estar sendo feito agora se refere às perspectivas futuras para o rio Doce e sua população, pois caminhamos de fato para um impacto ambiental irreversível, uma vez que espécies endêmicas pode ter sido simplesmente varridas pela onda de poluição e rejeitos que por ali passou. Além disso, há o problema das famílias, não só aquelas que perderam tudo com a passagem da lama, mas sim e principalmente aquelas que dependem do rio como forma de sustento. De onde estes pescadores irão garantir a realização de sua atividade profissional? Há um plano emergencial para esta situação? Ou os governos federal e estadual também vivem naquele misto de "se eu não fizer outro fará" e "se nunca aconteceu, por que aconteceria agora?"...

O grande fotógrafo de Minas, Sebastião Salgado deu essa semana uma entrevista contundente, em defesa de Minas Gerais, dos mineiros e principalmente do rio Doce, enfatizando a ideia central de sua fala sobre o desastre ambiental no referido rio, afirmando veementemente que "vamos recuperá-lo!". Admiro muito Sebastião Salgado, sou fã incondicional de sua fotografia e de sua 'mineirice' desmedida, mas discordo dele em 2 pontos básicos. Em primeiro lugar, por quê NÓS vamos recuperar o rio Doce? Em segundo lugar, a preocupação de enfatizar que a VALE estaria disposta a patrocinar um fundo de recuperação das nascentes da bacia do rio Doce, que sofre há décadas com o desmatamento e demais atividades antrópicas.

Ora, parece-me pouco efetivo em uma situação de emergência e catástrofe no médio e baixo curso do rio, que as ações e planos de mitigação de problemas se refiram ao alto curso e às nascentes do mesmo, embora saiba e admita a necessidade destas ações, parece-me pouco eficaz resolver os problemas de Mariana investindo na nascente do rio no município de Ressaquinha, na Serra da Mantiqueira. Mas enfim, é só uma opinião...

Finalizo, por hora, com uma frase que tenho repetido seguidas vezes nos últimos anos, seguida de sua rápida explicação, para que não hajam falsas e tendenciosas interpretações. Tenho dito que "o grande problema do Brasil tem sido o brasileiro", e explico! Não por qualquer desvio de caráter, índole, má fé ou qualquer outro defeito pejorativo, mas sim pela capacidade que temos de nos adaptar e nos virar em quaisquer situações, dando sempre um jeito de "consertar" as coisas que nos são entregues erradas. Isso traz para nós uma acomodação, e uma incapacidade de cobrança, que nos torna capazes de dar um jeitinho para tudo que não está certo, ao invés de exigir que seja feito e nos entregue do modo correto.

Criamos uma capacidade enorme de dizer "vamos recuperá-lo", quando deveríamos dizer "vocês serão responsabilizados"...

Continua...






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