domingo, 15 de novembro de 2015

O DESASTRE SÓCIO-AMBIENTAL DE MARIANA - MG (parte 1)

A má companhia no vale do rio Doce
Por Éder Israel



Disponível em: <http://assets1.exame.abril.com.br/assets/images/2015/11/590860/size_810_16_9_bombeiro-resgata-cachorro-em-mariana.jpg> Acesso em 12 nov. 2015

O dia 05 de novembro de 2015, possivelmente será lembrado por muito tempo como sendo a data oficial a constar no atestado de óbito do rio Doce, um dos mais importantes do estado de Minas Gerais. Foi de fato um duro golpe (na verdade dois...) o rompimento das duas barragens de rejeitos de mineração na unidade industrial de Germano, no município de Mariana.

As barragens de Fundão e Santarém ruíram e uma torrente de lama varreu o distrito de Bento Rodrigues quase que por completo do mapa, levando consigo bens, vidas, histórias, tudo...

Passagem da lama pelo distrito de Bento Rodrigues -MG


Disponível em: <http://s2.glbimg.com/sc-9OPInVyZEEOZEVxfGYsk-J_s=/s.glbimg.com/jo/g1/f/original/2015/11/12/antes-depois-map1_1.gif> Adaptado. Acesso em 13 nov. 2015

Após os acidentes, (embora o termo acidente seja inviável, é o que a lei determina antes das devidas averiguações) criou-se uma onda de revolta nas redes sociais contra a empresa, que chegou a ser maior que a comoção em relação às indefesas vítimas carregadas pela enxurrada de lama que desceu as encostas das serras das “Geraes”... Mas enfim, é difícil entender as pessoas em momentos de grandes tragédias, embora pareça-me racional a revolta contra a irresponsabilidade técnica da empresa em questão, eram pessoas ali, gente...

Acredito que a catástrofe em Mariana possa vir a ser apenas a ponta de um enorme iceberg, que até hoje fingimos ser apenas um pequeno bloco de gelo flutuando em uma mar de aparente tranquilidade. Mas até que um navio bata no iceberg e afunde, ninguém se preocupa em sinalizá-lo aos navegantes desavisados. Foi assim com as barragens de Fundão e Santarém, duas pontinhas minúsculas de "gelo", que escondiam uma imensidão de rejeitos industriais de mineração, nesse estado que pelo próprio nome atente por MINAS Gerais.   

Uma tragédia ambiental dessa magnitude, traz-nos preocupações que por tempos passam despercebidas. Mas, no momento em que a mídia volta suas atenções para a temática, somos forçados a procurar bases mais sólidas de dados. É nesse momento que nos damos conta, de quão calamitosa é a situação em um país onde o lucro exponencial torna-se imperativo e a responsabilidade com os custos e perdas para a obtenção deste lucro tornam-se preocupações secundárias. Refiro-me aqui ao Brasil, nessa busca de lucro inconseqüente por uma questão metodológica. Porém, sabemos que o mundo inteiro está funcionando dessa mesma forma.

Mas considero pormenorizar demais a discussão a respeito deste tema, apenas a uma crítica ao sistema capitalista, como sendo o grande causador de toda a tragédia ambiental e social do mundo. Muito tenho ouvido e lido a respeito da culpabilidade do "sistema" pelo ocorrido em Mariana, mas sinceramente, colocar o capitalismo como raiz do problema seria por demais livrar a barra do ser humano, que vive em um misto de "se eu não fizer outro fará" e "se nunca aconteceu, por que aconteceria agora?". Lembremos que o "acidente" de Chernobyl, ocorreu em um "sistema" totalmente diferente, em que a postura humana de não se atentar para os avisos e indicadores de risco em suas atividades, levou a uma tragédia sem precedentes, independentemente da busca ou não pelo lucro.

A empresa responsável pela mineração na região de Mariana, a SAMARCO MINERAÇÃO S.A., fundada em 1977, é administrada (na verdade pertence, no bom português, por tratar-se de uma joint-venture) por dois sócios majoritários, a VALE S.A. e  BHP BILLITON, tendo sido a mesma considerada, neste ano de 2015, a décima maior exportadora mineral do Brasil, o que nos traz uma ideia, ainda que vaga, sobre os reais ganhos dessa grande mineradora "brasileira". Porém, uma informação importante, que a mídia (por razões escusas) não noticia, é o fato de que o direito de exploração da área minerada atualmente, e palco do acidente do ultimo 05 de novembro, foi concedida à SAMARCO por uma outra mineradora, a SAMITRI (S.A. Mineração Trindade), o que vai possivelmente abrir uma brecha daquelas típicas do Brasil, na determinação dos verdadeiros responsáveis pela tragédia anunciada.

Duas outras preocupações me ocorrem acerca da gestão dos riscos da mineração nas Minas Gerais: uma pontual na área específica de Mariana, local do referido desastre, e outra mais ampla, externada para todo o estado mineiro, embora ambas tenham o mesmo questionamento, sobre as perspectivas futuras desta atividade que historicamente responde por fatias significativas do PIB mineiro.

A primeira preocupação se refere ao risco de rompimento de uma nova barragem de rejeito de mineração na mesma área, chamada barragem de Germano, que segundo dados da própria empresa (SAMARCO) possui um volume de material três vezes maior do que aquele liberado por Santarém e Fundão. O problema surge, quando a vazão da torrente de lama da barragem do Fundão, passou à margem da barragem de Germano, o que pode ter provocado um processo de erosão capaz de comprometer a estrutura da mesma.

Área de ocorrência do rompimento das barragens em Mariana - MG


Fonte: Elaboração própria.

De acordo setores da mídia mineira, responsáveis técnicos da SAMARCO e do Corpo de Bombeiros, confirmaram a existência de uma rachadura (trinca) de 3 metros na barragem de Germano, mas segundo estes mesmos técnicos, não existe qualquer risco de rompimento da mesma, devido à sua grande dimensão frente aos danos observados, os quais já encontram-se em correção pela empresa. A SAMARCO havia afirmado também que não havia qualquer risco de rompimento das barragens de Fundão e Santarém, tanto que recebeu, recentemente, do governo estadual um selo de qualidade em gestão de riscos ambientais...

Minha segunda preocupação se refere à gestão dos demais lagos desse tipo existentes em Minas Gerais. Segundo o Ministério das Minas e Energia, existem no estado pelo menos outros 470 depósitos de rejeitos industriais do setor de mineração, os quais passaram até hoje praticamente despercebidos aos olhos da mídia e dos mineiros, como um grande iceberg que navega calmamente sob um oceano de águas barrentas e turvas, fingindo ser apenas um pequeno bloco de gelo que flutua mansa e inofensivamente...

Continua...


  

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