MINORIA ÉTNICA UIGHUR NA
CHINA
- Prof. Éder Israel
Câmeras instaladas pelo
governo chinês monitoram a vida da população Uighur, em Xinjiang.
Disponível
em: <https://www.thenation.com/wp-content/uploads/2019/03/uighurs-school-xinjiang-rtr-img.jpg?scale=228&compress=80>
acesso em 04 fev. 2021
Os
uighures compõem um dos múltiplos grupos étnicos da China, porém eles não
habitam apenas essa nação asiática. Existem grupos numerosos desse povo, de
origem turcomena, que vivem principalmente em territórios na Rússia, Cazaquistão,
Quirguistão, Uzbequistão, Tadjiquistão e Turquia. Em território chinês os
uigures perfazem cerca de 10 milhões de habitantes, que em sua maioria são
muçulmanos, e vivem concentrados no extremo Noroeste do país, na região de
Xinjiang, que goza de relativa autonomia em relação ao governo central de
Pequim.
Concentração da
população Uighure na China, onde habitam nas fronteiras da Ásia Central.
Disponível
em: <https://atalayar.com/sites/default/files/styles/foto_/public/noticias/Atalayar_Manifestante%Hong0Kong%20apoyo%20uigures>
acesso em 04 fev. 2021
Até
pouco tempo atrás o mundo não tinha qualquer tipo de atenção voltada a essa
minoria étnica, mas recentes acusações de crimes cometidos contra o governo
chinês contra esse povo, e principalmente após o ex-presidente Donald Trump, em
um de seus últimos atos no cargo, acusar formalmente a China de genocídio conta
os uighures, protestos começaram a se espalhar pelo mundo e a história desse
relativamente pequeno grupo muçulmano começou a fazer parte dos debates da
imprensa internacional.
A região ocupada por essa minoria étnica tem
se tornado atualmente cada vez mais valorizada pelo Estado chinês, seja por
conta das terras agricultáveis (Xinjiang é historicamente uma região de baixa
densidade demográfica no país, e, portanto goza de vastas áreas disponíveis),
ou pelas reservas de recursos minerais ali encontradas, ou ainda, e talvez principalmente,
pela sua localização estratégica na zona de fronteira com várias outras nações
asiáticas, no “caminho para a Europa”. Sabe-se que a China tem estruturado um
audacioso programa de logística global, batizado de A Nova Rota da Seda, que
visa integrar a potência asiática ao restante do mundo, e a Ásia Central é
ponto fundamental para as aspirações integracionistas do Partido Comunista
Chinês - PCCh.
Após
a notoriedade recente, proliferaram nos noticiários informações a respeito da
perseguição que o governo de Pequim realiza contra esse e outros grupos
minoritários do país, como ocorre em relação aos monges tibetanos, para citar
apenas um dos vários exemplos. No caso dos Uighures o próprio Estado chinês
admite a existência de estruturas penitenciárias, que são chamadas de “Campos
de Reeducação”, para onde são levados os presos desse grupo. E é exatamente a
respeito desses campos/prisões que se formalizou a fala de Donald Trump, posto
que se multiplicam na imprensa as acusações de maus tratos, trabalho análogo à escravidão
e torturas, tudo prontamente negado pelo governo central de Pequim.
Organizações internacionais dos Direitos Humanos acusam ainda o PCCh de
realizar prisões e julgamentos arbitrários e de estar promovendo uma lavagem
cerebral em massa nessa população, em nome de uma suposta “reeducação social”.
Imagem de satélite
mostra um novo “Campo de Reeducação” construído na província de Xinjiang.
Disponível
em: <https://ichef.bbci.co.uk/news/800/cpsprodpb/13FFB/production/_104051918_china4.jpg>
acesso em 04 fev. 2021
Nos
últimos meses surgiram indícios de que outras nações estariam tendo coautoria
nos crimes contra os Uighures, com destaque para o apontamento de que o governo
turco estaria prendendo pessoas desse grupo étnico que vivem em seus
territórios e as deportando para a China, onde seriam sumariamente encaminhadas
para os campos mantidos pelo Estado. A alegação do governo chinês, de que
nesses campos a reeducação seria voluntária e que as prisões seriam
justificadas para se tentar combater o extremismo religioso desses grupos
muçulmanos não encontra ressonância nas outras nações e nem mesmo em
organizações internacionais, que pressionam diuturnamente a China a promover
mudanças no tratamento destinado à população Uighur.
Ao
redor do mundo, e principalmente nas nações com grandes comunidades muçulmanas,
são realizados protestos, com apoio dos governos ocidentais e da mídia
internacional, em defesa da libertação e do respeito à dignidade desse grupo
étnico. Porém, do lado do PCCh não há nenhum sinal de que tais mudanças
estariam próximas de acontecer. O maior problema relacionado à solução do caso
é o fato de a China possuir grande poder geopolítico na atualidade,
principalmente por fazer parte do Conselho de Segurança da ONU tendo, portanto,
a prerrogativa de vetar qualquer decisão tomada pela organização que vá contra
os interesses e políticas implementadas pelo Estado autoritário asiático.
Segundo
observadores internacionais um dos principais temores do governo da China é que
esses grupos minoritários, que por séculos habitam regiões isoladas do país,
criem um senso de “unidade nacional”, ou mesmo se tornem muito numerosos, a ponto
de apresentar uma ameaça ao governo instituído, e principalmente atuarem em
prol de processos separatistas. Por isso, uma das grandes acusações que recaem
sobre a administração dos “Centros de Reeducação” é a respeito da esterilização
forçada e em massa das mulheres uighures ali detidas, como uma tentativa de
cessar as taxas de natalidade e eliminar o crescimento demográfico dos grupos
étnicos não favoráveis ao Estado. Outras ações nesse mesmo sentido foram
observados em anos anteriores, quando o governo da China incentivou a migração
de chineses leais ao governo para a região de Xinjiang, numa tentativa aberta
de equilibrar a composição étnica regional e aumentar a vigilância sobre grupos
opositores ao PCCh.
Muçulmanos em Bangladesh
manifestam apoio à população Uighur reprimida na China.
Disponível
em: <http://thedailynewnation.com/library/1547828699_0.jpg> acesso em 05
fev. 2021
Infelizmente
povo Uighur faz parte de uma crescente estatística global, que representa povos
e grupos étnicos em condição de perseguição por parte de populações
majoritárias ou pelos próprios Estados constituídos nas nações onde se inserem,
como se observa atualmente com o povo Rohingya, perseguido e dizimado em
Myanmar, ou o povo Curdo, que sofre perseguições há décadas no Oriente Médio, ou
ainda povos na região do Cáucaso, como os Chechenos, subjugados pelo Estado
russo em uma guerra civil que se arrasta desde o término da Guerra Fria. O
discurso do governo chinês acerca das ações contra esse grupo muçulmano de
Xinjiang não condiz com a realidade, nem pela insólita afirmação de que os
uighures buscariam voluntariamente os “Campos de Reeducação”, e nem pela propalada
justificativa de que se faz necessária tal intervenção, em prol do crescente
extremismo religioso desse povo, posto que ela não se materialize de fato.
Resta
ao mundo esperar que o PCCh acene na direção do término das práticas opressoras
sobre essa minoria nacional, como é comum no atual mundo globalizado, quando
uma nação sofre uma grande pressão externa que ameaça seus interesses econômicos.
Sabe-se que as motivações econômicas são hoje as principais molas motrizes das
sociedades globais, e tudo que as ameace precisa ser eliminado ou superado. O
governo chinês vê os uighures como um empecilho ao seu projeto hegemônico
autoritário. Porém, se uma pressão externa representar riscos de perdas
financeiras ainda maiores é provável que o país busque tirar proveito da
situação, criando uma falsa imagem de ser aquele libertou o povo uighures de
sua própria opressão...
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